Confira abaixo a entrevista com o professor e veterinário especialista em Leishmaniose da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Dr. André Luis Soares da Fonseca, publicada pelo Jornal de Jales em 13/11/2011.
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Por Vivian Curitiba
Quais as causas da expansão da Leishmaniose no Brasil?
A causa principal da expansão da Leishmaniose no Brasil é a falta de técnica em controle do vetor. O país, infelizmente, é muito grande. Por uma questão assim, não dá para entender, a qualidade dos profissionais envolvidos, tanto ética, como tecnicamente envolvido no controle da leishmaniose é muito duvidosa. Temos muitos profissionais com doutorado e mestrado, mas sem uma capacidade crítica importante. Infelizmente isso até mostra uma falha no sistema de gerenciamento de cursos de pós-graduação.
A Portaria Interministerial 1429/2008, proíbe o tratamento do cão infectado e condena o cão à morte. O que o senhor pensa sobre isso?
Na verdade a Portaria não proíbe o tratamento do animal, ela proíbe o uso de medicamento de uso humano específico para tratamento da leishmaniose. Isso acontece justamente por uma questão de falta de visão técnica clara dos responsáveis por isso, porque na verdade não existe remédio veterinário, remédio humano, o remédio existe para tratar uma doença, ele age, por exemplo, sobre o DNA do parasita e não sobre o DNA do ser humano, então não tem lógica querer proibir. A Portaria simplesmente veta em termos o uso dos medicamentos tradicionais para uso no controle de leishmaniose, que na verdade é um grande engano.
Há risco para o ser humano conviver com o cão infectado?
Não há risco nenhum para ser humano conviver com o animal infectado. A Leishmaniose como acontece no caso da dengue, é uma doença vetorial e a presença do animal doente em casa simplesmente indica que há presença do vetor naquele ambiente. Então, o controle de uma doença vetorial se faz o controle de vetor, é o que acontece exemplificativamente no caso da dengue, então risco não há.
Existem as verdades e mitos da Leishmaniose Visceral Canina. Se existe tratamento, por que tanta polêmica quanto ao uso de medicamentos?
Na verdade, o que acontece, é que no Brasil especificamente quer se implantar uma política de controle da leishmaniose através de eutanásia canina. Essa política foi implantada há mais de 15 anos, os resultados não apareceram, acho até que por uma questão de moral desses técnicos envolvidos, voltar atrás agora seria reconhecer incompetência, então por uma questão até de falta de brilho ético, por uma questão até de vaidade e de orgulho eles não querem voltar atrás nessa decisão e eles sabem que isso é ineficaz.
É possível o ser humano transmitir a doença?
Tanto o animal como o ser humano podem transmitir a doença. Existem duas formas de leishmaniose, a chamada zoonótica e antroponótica. A zoonótica é quando a transmissão é feita entre o ser humano e animais e animal com ser humano, quer dizer, uma via de mão dupla. Existe a antroponótica que é aquela em que o hospedeiro, principal transmissor é o ser humano, é o que acontece, por exemplo, na Índia.
No mundo nós temos 400 mil casos de leishmaniose aproximadamente por ano.
No Brasil, nós temos 4.000, ou seja, 1 % desse total. A Índia tem sozinha aproximadamente 260mil casos de leishmaniose visceral por ano. Na Índia a leishmaniose não é zoonótica, ou seja, não há participação do cachorro, simplesmente do ser humano, ela é antroponótica.
O ser humano pode transmitir a doença?
Pode sim. Tanto o ser humano como o animal, quanto mais infectado, maior a possibilidade de transmitir a doença. Por isso o tratamento tem essa eficácia de controle, ele reduz a carga parasitária, diminui o número de parasitas no animal, mas não pode ser usado como única terapia, tem que ser usado também o uso de repelentes constantes no animal e a dedetização e controle ambiental dos mosquitos no local onde tem o animal doente ou a pessoa doente.
O cão tratado é um transmissor ou portador?
São conceitos diferentes. O transmissor é aquele que é capaz de transmitir a doença, quanto mais sintoma tem animal, maior o risco dele transmitir. Posso ter um animal que é um transmissor e ter um animal que pode simplesmente ser um portador e não um transmissor. Acontece que, quanto menos sintomas há menor o índice o índice de transmissão desse animal. Voltamos à história, o tratamento se justifica por que diminui a carga parasitária, diminui o risco de transmissão e se você alia às técnicas sabidamente conhecidas e eficazes como o uso de coleira e repelentes, o índice de picadas diminui até 95%. Então voltamos de novo à mesma história, tratar o animal, usar repelente no animal e desinsetização do ambiente.
Retornando ao tema tratamento para que fique bem esclarecido ao leitor. Na Europa e em outros países os cães são tratados. Por que é proibido no Brasil?
Tratamento não é proibido no Brasil, o problema é que se quer dar interpretação da proibição. Primeiro, proibição de tratamento tem que ser mediante lei. O que existe é uma portaria restringindo o uso de medicamentos. No caso, por exemplo, da tuberculose, existe uma lei de 1942, que proíbe o tratamento de animais com tuberculose, mas em 1942 não existia ainda comercialmente a penicilina, então não tinha mesmo como tratar. Precisamos fazer uma interpretação mais moderna dessas leis antigas. Essas leis não foram recepcionadas pela constituição, então não existe proibição ainda.
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